Em maio de 2025, Reino Unido e União Europeia deram início a um novo capítulo de cooperação, após anos de tensão e incertezas provocadas pelo Brexit. O chamado “reset” nas relações bilaterais foi oficializado durante um encontro em Londres entre o primeiro-ministro britânico Keir Starmer e a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, resultando em uma série de acordos que visam restaurar a confiança mútua e retomar a integração parcial em áreas estratégicas como comércio, defesa, pesca e mobilidade juvenil.

O novo pacto, descrito pelo The Guardian como “o mais ambicioso desde a saída formal do Reino Unido da União Europeia”, marca uma guinada pragmática no governo Starmer, que mesmo sem rever o Brexit, busca mitigar seus impactos negativos. Segundo a France24, o acordo inclui a redução de barreiras alfandegárias e um alinhamento mais flexível com os padrões da União Europeia, especialmente na área de produtos alimentícios, o que pode baratear os custos de importação e beneficiar consumidores britânicos.

No campo da defesa, o pacto prevê a participação do Reino Unido em projetos financiados pelo Fundo Europeu de Defesa e o estreitamento da cooperação em segurança cibernética e mobilidade militar. Em entrevista à RFI, o analista político Jean-Dominique Giuliani, presidente da Fundação Robert Schuman, declarou que “esta aproximação é um passo importante para enfrentar ameaças globais como guerra cibernética, terrorismo e instabilidade no leste europeu, onde uma resposta coordenada é essencial”.

Um dos pontos mais controversos do acordo diz respeito à pesca. O Reino Unido aceitou estender por mais 12 anos o acesso de embarcações europeias às suas águas territoriais. O gesto, interpretado como concessão comercial em troca de vantagens alfandegárias, foi criticado por setores da indústria pesqueira britânica, que apoiaram o Brexit justamente em defesa do controle soberano sobre os mares. Em matéria da BBC, representantes do setor afirmaram que a decisão representa “uma traição às promessas feitas ao eleitorado costeiro”, reacendendo o debate sobre soberania pós-Brexit.

Outro destaque importante é o plano de criação de um programa de mobilidade juvenil, semelhante ao antigo Erasmus+, voltado para facilitar intercâmbios acadêmicos, profissionais e culturais entre jovens britânicos e europeus. Embora os detalhes ainda estejam em discussão, a medida foi bem recebida por entidades educacionais. Ao Financial Times, a diretora da University Alliance, Vanessa Wilson, afirmou que “essa iniciativa pode ajudar a reconstruir pontes entre as juventudes dos dois lados do Canal da Mancha e restaurar uma das perdas mais simbólicas do Brexit: a livre circulação de ideias e experiências entre jovens”.

O pacote inclui ainda a reabilitação do uso dos eGates — portões eletrônicos de controle de fronteiras — para cidadãos britânicos em aeroportos da UE, o que deve facilitar as viagens e reduzir filas. Para muitos analistas, esses gestos técnicos sinalizam uma tentativa de reconstruir a integração funcional, sem recorrer à adesão plena ao bloco.

As críticas, no entanto, não desapareceram. Partidos eurocéticos e setores da ala conservadora do parlamento britânico acusaram o governo de ceder demais. Em entrevista ao Politico, o ex-ministro Jacob Rees-Mogg argumentou que o Reino Unido está “voltando à condição de vassalo da UE, sujeito a regras externas sem poder de decisão”. A crítica toca em um dos pontos sensíveis do acordo: ao alinhar-se a padrões europeus para facilitar o comércio, o Reino Unido pode acabar se tornando um “rule taker” — um receptor de regras — sem assento nos fóruns decisórios de Bruxelas.

Apesar disso, economistas apontam ganhos potenciais. Estimativas do Tesouro britânico citadas pela Al Jazeera sugerem que o novo acordo pode adicionar até 12 bilhões de libras à economia do Reino Unido até 2040, além de contribuir para a estabilidade dos preços, especialmente no setor alimentar, que sofreu fortemente com as disrupções do Brexit.

O encontro entre Starmer e von der Leyen encerrou-se com declarações otimistas. Para a presidente da Comissão Europeia, o novo pacto “abre um novo capítulo baseado em confiança e interesses compartilhados”. Já Starmer, que tem procurado projetar uma imagem de líder pragmático e conciliador, afirmou que “o acordo mostra que é possível respeitar o resultado do referendo e, ao mesmo tempo, construir uma relação madura e produtiva com a Europa”.

O redesenho das relações entre o Reino Unido e a União Europeia não encerra as divisões políticas causadas pelo Brexit, mas representa uma tentativa concreta de superar seu legado mais imediato: o isolamento, a desconfiança e os prejuízos econômicos. Trata-se, nas palavras do professor Anand Menon, especialista em política europeia entrevistado pela BBC, de “um realismo tático, não de uma reconciliação sentimental”. Ainda assim, pode ser o começo de um caminho mais estável — e menos hostil — entre dois vizinhos forçados a conviver.

https://www.france24.com/en/europe/20250519-deals-defence-fishing-youth-visas-uk-eu-post-brexit-reset-agreement

https://www.ft.com/content/1d301451-72cc-4eb0-a9c9-1d0f6930b520

https://www.bbc.com/news/articles/ce9v28r7vlxo

https://www.theguardian.com/politics/2025/may/19/uk-eu-brexit-reset-talks-starmer-summit

https://www.politico.eu/article/uk-pm-keir-starmer-big-brexit-summit-everything-to-know-eu-relations-von-der-leyen

https://www.rfi.fr/en/international/20250519-eu-and-uk-reunite-in-london-for-talks-on-diplomacy-and-defence

https://www.aljazeera.com/news/2025/5/21/will-eu-deal-make-food-cheaper-add-12bn-to-the-uk-economy?utm_source=chatgpt.com