Pouco depois de a Rússia bombardear Kiev com drones Shahed-136, de presumível proveniência iraniana, o ministro ucraniano do Exterior, Dmytro Kuleba, anunciou a Israel que faria um pedido oficial ao país para o fornecimento de sistemas de defesa aérea. Por sua vez, o Irã refutou como falsas as notícias de que haveria fornecido drones a Moscou.

Não é a primeira vez que Ucrânia pede apoio militar a Israel, que, no entanto, até agora evita a exportação direta de armas para o país sob ofensiva militar russa. Em vez disso, tem ajudado os ucranianos com recursos humanitários, entre os quais também coletes à prova de bala e capacetes.

Ao colocar em cena o arqui-inimigo israelense, Teerã, contudo, a mais recente guinada evidenciou de novo o dilema de Tel-Aviv quanto à invasão da Ucrânia sob ordens de Vladimir Putin.

Desencadeou-se um novo debate sobre como Israel pode prosseguir com seu atual malabarismo: por um lado, o governo do primeiro-ministro Jair Lapid tem criticado a invasão, em parte severamente, e concedido cada vez mais ajuda à Ucrânia; por outro, até agora tem evitado conceder apoio militar direto, a fim de não comprometer suas relações com Moscou.

“Onde estiver o Irã, Israel deve estar do outro lado”
Em telefonema com o ministro Kuleba, na noite de quinta-feira, o premê Lapid comunicou que recebera uma atualização relativa ao progresso da guerra, e reforçou que Israel “está do lado do povo ucraniano”. O requerimento formal de sistemas antiaéreos não foi mencionado no comunicado.

Na véspera, discursando a embaixadores da União Europeia em Israel, o ministro da Defesa Benny Gantz assegurara que seu país “está do lado da Ucrânia”: “Nós dissemos isso no passado e repetimos hoje: a política de israel consiste em apoiar a Ucrânia com auxílio humanitário e com o fornecimento de equipamento defensivo para salvar vidas.”

Gantz ressalvou que, embora não vá haver entrega de sistemas armamentistas “por uma variedade de considerações”, Israel poderia ajudar a “desenvolver um sistema de alerta precoce que salvará vidas”.

Também entre analistas se debate acaloradamente a presente atitude israelense quanto à guerra na Ucrânia. “Israel segue se comportando de modo que, no fim, vai se dar mal de ambos os lados”, criticou o jornalista Nadav Eyal no diário Jediot Achronot. “Os ucranianos estão furiosos por Israel não ajudar. E os russos, ao aceitar a ajuda do Irã, também ajudam os iranianos, e operam contra Israel em diversos níveis.”

Amos Yadlin, ex-diretor do serviço secreto militar Aman, comentou: “Devemos ficar do lado dos que partilham nossos valores: com as nações democráticas da Europa e com os Estados Unidos, que são contra a agressão russa contra a Ucrânia.” Desde o início da ofensiva no Leste Europeu, ele se posicionou por um apoio israelense mais ativo: “O Irã é nosso maior inimigo. E sempre que o Irã está do lado de alguém, devemos estar do outro lado.”

Comunidade judaica na Rússia e segurança à porta de casa
Desde o começo da invasão russa, em 24 de fevereiro, Tel Aviv presta assistência humanitária à Ucrânia, ao mesmo tempo que tenta manter as relações diplomáticas com Moscou. Paralelamente, corre no país um debate sobre os deveres morais, também de acolher os refugiados e imigrantes da Ucrânia e da Rússia. No entanto a abordagem israelense segue suas próprias considerações políticas e diplomáticas, com ênfase no destino da comunidade judaica na Rússia.

Na década de 1990, após o colapso da União Soviética, mais de 1 milhão de judeus russos imigrou para Israel. Agora, apenas em 2022, já chegaram outros 20 mil, entre os quais jovens tentando escapar da mobilização militar parcial decretada por Putin. O processo em curso sobre a ameaça de fechamento da semiestatal Jewish Agency em Moscou, que assiste judeus na emigração para Israel, ilustra bem a atual pressão sobre as instituições judaico-russas.

Também têm grande peso as considerações de política de segurança à própria porta de casa: desde que deu apoio ao regime de Bashar al Assad na guerra civil da Síria, a Rússia passou a controlar parte do espaço aéreo sírio. Por sua vez, Israel executa regularmente ataques aéreos contra assim chamados alvos iranianos na Síria, e contra entregas de armas à pró-iraniana milícia libanesa Hisbolá.

A coordenação militar estreita – uma espécie de “telefone vermelho”, através do qual Israel informa à Rússia sobre ofensivas aéreas iminentes – garante às Forças Armadas israelenses a urgentemente necessária “liberdade de ação” para executar tais ofensivas aéreas.

Uma “Cúpula de Ferro” para a Ucrânia?
A Ucrânia gostaria de dispor de sistemas antimísseis poderosos como a “Cúpula de Ferro”, a “Funda de Davi” ou o “Barak 3”. Certos especialistas em segurança israelenses ressalvam, contudo, que seu país não dispõe de suficientes sistemas de defesa para poder exportá-los.

Além disso, frisa Yadlin, a “Cúpula de Ferro” é operada com uma tecnologia secreta, “que Israel não deseja que caia nas mãos dos russos ou, acima de tudo, dos iranianos que agora se encontram na Crimeia” – a península ucraniana ilegalmente anexada por Moscou em 2014.

“A boa notícia”, prossegue o especialista israelense, “é que os drones iranianos são alvos fáceis, pois voam a altitude e velocidade baixas”. “Portanto pode-se ajudar a Ucrânia com sistemas de defesa aérea menos sofisticados, que Israel já vendeu a outros países.”

No momento, os indicadores são, antes, que Israel manterá seu presente curso. “Estamos acompanhando a participação do Irã na guerra na Ucrânia. Vemos que num presente próximo ele possivelmente fornecerá sistemas adicionais”, afirmou o ministro Benny Gantz aos embaixadores da UE. Teerã está ativo “no Iraque, Síria, Líbano, Iêmen e outros locais”, e Israel “vai continuar desenvolvendo e mantendo suas próprias capacidades”, garantiu o chefe da Defesa israelense.

Fonte: DW Brasil