Em 19 de setembro de 2018, após assinar a Declaração de Pyongyang com o então presidente sul-coreano Moon Jae-in, o líder norte-coreano Kim Jong Un declarou seu desejo de que a Península Coreana ficasse livre de armas nucleares. A Coreia do Norte seguiu as promessas de seu líder fechando alguns locais de testes nucleares e mostrando disposição para desmantelar outros. Antes desses movimentos, Kim Jong-un já havia iniciado uma moratória unilateral sobre atividades nucleares e de mísseis em abril de 2018. Parecia que um caminho para a desnuclearização da Península Coreana havia finalmente sido encontrado.
Mas desde o início de 2022, presenciamos um quadro diferente. Em janeiro, Pyongyang cancelou sua moratória nuclear e de mísseis e testou mais de 50 mísseis balísticos. Pyongyang também revelou sua posse de armas nucleares táticas. Kim Jong-un declarou a irreversibilidade do armamento nuclear da Coreia do Norte, impedindo qualquer negociação diplomática sobre a desnuclearização.
Uma oportunidade de ouro foi perdida em fevereiro de 2019. O ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump e o presidente Kim Jong Un se encontraram em Hanói entre 27 e 28 de fevereiro pela segunda vez. Na cúpula de 28 de fevereiro, Kim propôs que o Norte desmantelasse todas as instalações nucleares em Yongbyon em troca de um relaxamento parcial das sanções do Conselho de Segurança da ONU contra a Coreia do Norte. Trump, no entanto, recusou e propôs que o Norte abandonasse completamente suas armas nucleares e bioquímicas e mísseis balísticos. Kim ainda queria mais discussões durante o almoço, mas Trump cancelou e foi embora.
No final de junho de 2019, Trump se encontrou com Kim em Panmunjom pela terceira vez e prometeu suspender os exercícios militares conjuntos com a Coreia do Sul em troca da retomada das negociações. Sua promessa não foi mantida e a Coreia do Norte rejeitou a proposta dos Estados Unidos.
Embora a Coreia do Norte tenha comparecido a uma reunião com os Estados Unidos em Estocolmo no início de outubro de 2019, não houve progresso. A administração Trump continuou uma estratégia de ‘pressão máxima’ por meio de sanções intensificadas.
A Coreia do Norte não ocupa uma alta prioridade na agenda de política externa de Biden ao lado de questões relacionadas à China, à crise do Estreito de Taiwan e à invasão russa da Ucrânia.
Seul contribuiu para abrir canais de comunicação entre Pyongyang e Washington. Mas o revés da cúpula de Hanói foi um golpe crítico para o governo de Moon, e Pyongyang começou a mostrar uma atitude cada vez mais hostil em relação ao sul. O governo de Moon acabou falhando em reavivar o ímpeto para o diálogo.
O governo Yoon Suk-yeol da Coreia do Sul, inaugurado em maio de 2022, considera a política nuclear norte-coreana de seu antecessor um fracasso total e tem adotado uma política linha-dura. Fortaleceu a dissuasão estendida em parceria com os Estados Unidos.
A China agora é bastante indiferente. No passado, defendeu negociações diplomáticas baseadas no princípio de ‘congelamento por congelamento’, ou seja, tanto a Coreia do Norte quanto a parceria entre EUA e Coreia do Sul deveriam ser paralisadas. Mas presa entre a Coreia do Norte e os Estados Unidos, a China foi deixada de lado.
O Japão assumiu uma postura linha-dura, aderindo ao princípio de “desnuclearização primeiro, diálogo e incentivos depois”, e adotou sanções unilaterais.
A Rússia coordenou com a China, no Conselho de Segurança da ONU, o bloqueio de medidas direcionadas à Coreia do Norte. O apoio diplomático de Pyongyang à invasão da Ucrânia pela Rússia provavelmente fará da Rússia um fiel patrono da Coreia do Norte. No entanto, a Rússia não apóia o status da Coreia do Norte como um Estado de armas nucleares.
As principais partes interessadas compartilham um objetivo comum de desnuclearizar a Coreia do Norte, mas suas abordagens divergem. Um avanço exigirá pragmatismo e um novo acordo multilateral. Buscar soluções práticas deve ser um ponto de partida. A Coréia do Norte é um estado de armas nucleares em tudo, menos no nome. Definir a desnuclearização completa como o objetivo imediato das negociações diplomáticas é irreal.
O passo mais crítico é ouvir atentamente o que a Coreia do Norte deseja: a suspensão de exercícios militares conjuntos, a normalização diplomática e a suspensão das sanções. Essas demandas devem ser abordadas em qualquer negociação.
Dado o fracasso anterior das “Conversas a Seis” (reunião entre EUA, Coreia do Sul, Coreia do Norte, China, Rússia e Japão), um acordo multilateral pode soar idealista. Mas é improvável que o problema nuclear norte-coreano seja resolvido sem referência a uma perspectiva abrangente de segurança regional .
O ideal seria convocar uma cúpula anual de segurança no nordeste da Ásia. A participação do líder norte-coreano seria indispensável. Kim compareceria se o presidente dos EUA comparecesse e se a China o convencesse.
A questão aqui é se os Estados Unidos e a China podem cooperar. Dentro de uma estrutura institucional, todos os itens da agenda poderiam ser abordados. Entre outros, incluem desnuclearização, dissuasão estendida e exercícios militares conjuntos Coreia do Sul-EUA-Japão.
Desnuclearizar a Coreia do Norte é uma odisséia perigosa. Atitudes pragmáticas aliadas a acordos multilaterais podem ajudar a navegar nessa odisséia.
Fonte: Asia Times
Foto: Reuters