Em resposta à crescente crise de moradia que atinge as principais cidades do país, o governo da Espanha iniciou uma ofensiva sem precedentes contra a plataforma Airbnb e similares, ordenando o bloqueio de mais de 65 mil anúncios ilegais de aluguéis de temporada. A medida, anunciada em maio de 2025, tem como objetivo conter a escalada dos preços dos aluguéis residenciais e garantir o acesso à moradia para a população local, especialmente em áreas urbanas altamente turísticas como Madri, Barcelona, Valência e Bilbao.
Segundo a reportagem do El País (19/05/2025), a ação foi coordenada pelo Ministério do Consumo, que identificou uma ampla rede de ofertas turísticas sem registro oficial, violando regulamentações locais. Essas propriedades, muitas vezes controladas por grandes investidores e grupos imobiliários, são retiradas do mercado de aluguel residencial e direcionadas exclusivamente para turistas, o que contribui diretamente para a diminuição da oferta de moradias permanentes e o aumento explosivo dos preços.
De acordo com o G1, o impacto desses aluguéis de curto prazo tem sido devastador para moradores locais: famílias são expulsas de bairros inteiros, contratos tradicionais de aluguel tornam-se escassos, e os valores mensais ultrapassam os salários médios, forçando a migração para zonas periféricas. A situação é ainda mais dramática em regiões que vivem do turismo, como as Ilhas Baleares e as Canárias, onde a pressão do Airbnb está associada à gentrificação e à descaracterização de comunidades tradicionais.
A ministra dos Direitos Sociais, Ione Belarra, declarou que a medida é “uma resposta firme e necessária a um modelo de negócio que privatiza a cidade e transforma o direito à moradia em ativo especulativo”. A fala reforça o posicionamento do governo espanhol, que passou a tratar a moradia como um bem público essencial e não como mercadoria volátil sujeita à lógica do turismo de plataforma.
A BBC News Brasil também lembra que a Espanha não está sozinha nessa cruzada. Outros países já implementaram políticas rigorosas para conter os efeitos do Airbnb no mercado imobiliário. Em Amsterdã, por exemplo, aluguéis de curta duração são limitados a 30 dias por ano. Em Berlim, o aluguel turístico sem licença é proibido desde 2016. Em Lisboa, zonas de contenção foram criadas para proteger os bairros residenciais da “turistificação”. E em Nova York, regras mais severas entraram em vigor em 2023, exigindo que anfitriões estejam presentes durante a estadia dos hóspedes, restringindo significativamente a atividade.
Essas medidas têm em comum o entendimento de que a financeirização do espaço urbano — especialmente via plataformas digitais — agrava desigualdades, gera exclusão territorial e fragiliza os vínculos comunitários. A Espanha, ao seguir esse caminho, busca recuperar o controle sobre sua política habitacional e responder à crescente insatisfação popular com o custo de vida nas cidades.
Embora as plataformas como Airbnb argumentem que contribuem para o turismo local e a renda de pequenos proprietários, os dados revelam que a maioria dos anúncios é operada por investidores com múltiplos imóveis, e que os ganhos se concentram em poucos usuários. Para o governo espanhol, o desafio agora é regulamentar de forma eficaz e garantir que o turismo seja compatível com o direito à cidade.
A ofensiva atual pode se tornar um marco regulatório na Europa e inspirar outras nações a reavaliar o papel dessas plataformas na urbanização contemporânea. Em meio a uma crise global de moradia, a mensagem da Espanha é clara: cidades devem ser feitas para morar, não apenas para lucrar.
https://www.bbc.com/portuguese/articles/c89ppp1zlgqo
